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29 setembro 2008

Ponto isolado

Noite de inverno, ecoam os urros inexprimíveis pelas quatro paredes, inalando todas as lembranças das páginas rasgadas de um verão mofado.
Sou um ponto microscópico dentro de um quadrado espaçoso e vazio. Concentro-me em remover os pedaços agudos de vidro que ainda atormentam a minha alma com furos certeiros. Hemorragia sem sangue, dores que não deixam seqüelas. Não saio desta situação, quero livrar-me das memórias, de momentos passados, de figuras, cores, flores, dores! Que saia de mim esta alma, o maior reflexo de inferioridade, da falta de liberdade, uma angelical demonstração de fraude.
O telefone já tocou várias vezes fora do quarto, mas eu não quero atender. Não consigo atender. Pode ser alguém. Lógico que é alguém. Não quero falar com ninguém. No prezado momento, devido às aparentes circunstancias, o melhor é continuar a interpretar o meu personagem desta tragédia. Um ponto, um insignificante ponto dentro de uma atmosfera vazia. Um comportamento assim não me faz sentir dor e nem consola meu pranto, porém evita a ocorrência de uma possível acumulação de mais dor. O sofrimento já encheu o poço, não quero derramar. A minha respiração anda dançando um jazz atropelado, em que o ponto alto da música chega quando a cena final do verão aparece à minha mente.
Meu quarto tem uma janela, o único contato com o mundo frio de céu cinzento. Antes das nuvens chegarem e minha felicidade partir, eu era mais do que um ponto isolado dentro de um grande quadrado. Servia para algo, não era meramente um cômodo vivo.
Lá fora, a árvore do quintal balança, o vento não perdoa. Será que devo agir como o vento? A solidão está roendo meus neurônios, definitivamente preciso escrever um basta e sair do casulo. Não consigo ser mais do que este ponto, sou somente um ponto, antes éramos dois pontos buscando trocar palavras perfeitas um com o outro, agora sou um ponto. Espero que uma borracha venha para apagar-me. Viraria o nada. Mas não estaria mais como um ponto, sofrendo pela ausência de outro ponto.

O Ente

O ente
Doente
Acorda e mente
A corda em mente
Mente vazia
Sente (intermitente)
Pára.
Flui.

21 setembro 2008

Sedimentação subjetiva

Misturo-me ao líquido

Às reformulações do comportamento

Um sólido também teme a sua decomposição

Exatamente por esta razão tenta criar uma nova denotação

Para o seu viver instável

Impreciso

Isto realmente é preciso

Cochilo

Sedimento-me solidificado nos fatos

E pelo futuro das impossíveis chances

Deixo-me fluir...

A caixinha colorida

A rosa que você me deu
Vermelha como meu cabelo
Guardava aquele cheiro
De um amor jovial.
E a sua camisa listrada
Aquela que me deu de presente
Quando vivíamos loucamente
Costuma me trazer nostalgia.
E eu não pensei que viveria
O suficiente pra sentir alegria
Em nos ver separados
Talvez até distanciados
Pelo tempo traiçoeiro.
A visão da janela agora é incolor
E agora reflete aquele amor
Aquele, coberto de bolor
Enterrado para sempre, estupidamente
Em uma caixinha colorida
Na qual eu tento, e tanto
Jamais mexer novamente.