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26 maio 2010

Loucura


Cabelos negros, pele parda e um exímio observador calculista. Sua áurea misteriosa e o fascínio pela solidão o tornavam bastante diferente. O olhar frio era uma análise profunda da alma das pessoas. O seu silêncio era perturbador. Não tinha amigos nem colegas, apenas a solidão. Era apaixonado pela Solidão. Só a queria como sua única companheira...
Detestava multidões, fugia sempre de reuniões, trabalhos em grupo e de colegas. Tudo isso piorou na segunda faculdade. Decidiu tirar férias do trabalho e viajou para sua fazenda. Devido à chuva, demoraram quatro horas para chegar ao destino, mas logo sentiu o cheiro do chão e da areia molhada. Chegou quando já era noite.
Era uma casa pequena: um alpendre suspenso no acide, uma cozinha e um minúsculo banheiro. A casa era cercada pela mata. O açude estava cheio devido às chuvas. As gaivotas repousavam na margem do lago e os carões cantavam alegres. Segundo a cultura sertaneja, quando estes cantam era sinal de chuva. Mas o inverno estava passando depressa.
Três meses passaram rapidamente e a fartura do inverno acabou. A última chuva foi as lágrimas dos agricultores: era época de seca. O açude reduziu sua capacidade para menos da metade de seu volume. Os animais começavam a passar fome, pois o pasto acabara. Os arbustos eram secos e dos animais restavam suas carcaças no solo rachado.
Sentou-se no alpendre e observou uma cena rara e interessante: uma aranha devorando uma mosca, que ao distrair-se por um segundo, caiu na teia do aracnídeo faminto. Pensou, por um instante, que se a seca for prolongada, poderia morrer de fome.
O cerrado suspirava e o bafo quente vinha do poente. O solo, árido, rachava cada vez mais, deixando marcas da violenta seca que atingiu a região.
Alimentando-se de frutas e de alguns animais, passaram-se meses e a seca castigava cada vez mais. Os incêndios ficaram freqüentes e queimavam hectares de árvores frutíferas que prosperavam e, junto delas, os animais. Pouco a pouco a área que circundava a fazenda foi sucumbindo. Adriano começou a ficar desesperado, pois o açude secara e não restara muito das plantações.
A caçada à procura de animais tornou-se uma corrida contra a morte: Adriano sabia que um homem pode passar 28 dias sem se alimentar, mas três dias sem água era morte certa. Os animais foram dizimados e a água potável acabou: restariam apenas três dias de vida. Ficou parado, sem gastar energia, esperando algo que ele não acreditava: que chovesse. Como esperava, a sua força acabaram. A boca ficou seca e logo perdeu a consciência.
Acordou lentamente com o cheiro forte do éter. Tinha desmaiado na rua ao fugir do hospital, onde estava internado na ala psiquiátrica.

Um comentário:

Karoline Ferreira disse...

Como sempre, muuuuuuito bom, Raissa. Parabéns! Adorei esse também...